Xoteando Chico Doido: poesias apimentadas, passos arroxados e gargalhadas generosas No fim da tarde do último sábado, quando o sol dava os primeiros indícios de resguardar-se no horizonte, ou como diz o nordestino, à boca da noite, Ricardo Cabús sobe ao palco do teatro Jofre Soares recitando os versos em que Chico Doido de Caicó diz: “Sou doido por mulher/ sou doido por cachaça/ sou doido pra gastar dinheiro (...)”. Assim que as últimas palavras do poema são proferidas, “Sou doido propriamente dito”, o público começa a ambientar-se ao estilo do poeta e percebe que pode esperar versos afiados e sem qualquer pudor. A partir de então, todos permitem-se a uma viagem pelas paixões peculiares do poeta potiguar. Parecendo ter bebido na fonte de Zé Limeira, Chico Doido de Caicó não deixa de dialogar e citar o poeta do absurdo. Outro nome também constante na poesia de Chico Doido é Maria Antonieta Pons, atriz e dançarina cubana de grande sucesso na metade do século XX. As palavras que, de tão cabeludas, deixavam a plateia de rosto corado também foram capazes de arrancar boas gargalhadas ao trazer rimas e paralelismos inesperados. O estudante de filosofia, Carlos Augusto, ao final do recital, disse que “não esperava ver a poesia nordestina sem retratar a seca, a pobreza ou as paisagens naturais. Chico Doido de Caicó fala palavrão de forma tão natural que faz a gente perder a vergonha e cair na gargalhada.” Os xotes, ritmo escolhido para acompanhar a poesia, contemplaram diversos compositores nordestinos, de Luiz Gonzaga a Petrúcio Amorim. Entre um poema e outro, podia-se ouvir o músico Jâneo Amorim dedilhando em sua sanfona os acordes de ritmo constante e avexado. Assim, entre uma poesia apimentada, um passo arrochado e uma gargalhada generosa, o recital Xoteando Chico Doido trouxe ao palco, no dia de Santo Antônio, parte da cultura nordestina para que o público pudesse conhecer e reconhecer seus artistas locais de forma descontraída e irreverente. |